quinta-feira, 24 de novembro de 2016

A Epitácio de neon.

Há 40 anos saí de João Pessoa e só tenho lá voltado esporadicamente. Recentemente fiz um longo, vagaroso e nostálgico passeio por algumas dos principais recantos e avenidas da Capital da Paraíba. Na minha cabeça ia fazendo uma comparação de "como eram" e "como estão agora", as residências, praças, recantos e estabelecimentos comerciais. As esquinas continuam as mesmas mas o resto está muito, muito diferente. Talvez para aqueles que permanceram lá morando não percebam tanto estas transformações.

Onde eram casas e mansões bem cuidadas e ajardinadas hoje é uma farmácia, um lava-jato, uma igreja, uma pizzaria, um bar ou simplesmente, escombros, talvez decorrentes da briga de herdeiros pelo espólio do dono abastardo. Mesmo a modesta casa no Miramar onde vivemos nossa adolescência e juventude, hoje é um sobrado recém construído, descaracterizando, totalmente, o espaço que me traz tantas recordações e boas lembranças (neste caso a culpa pelo desmonte foi nossa que mudamos de cidade e vendemos a propriedade).

O tour nostálgico me entristeceu pois é como se uma parte da minha história, minhas referências tivessem sumido, sido apagadas do cenário onde vivi. Este é o preço que se paga pela modernidade, pela especulação imobiliária, pela falta de um planejamento urbano descente, pela ausência de zelo com a história, pelo desapego das coisas do passado, ou sei lá o quê.

A Avenida Epitácio Pessoa, talvez a mais famosa e emblemática delas, está completamente descaracterizada, comercializada, cheia de placas, letreiros e outdoors, sem padronização, causando um poluição visual que a "paraguainiza" e agride o meio ambiente, uma retilínea favela de neon. Sobraram poucas residências. Ainda resiste, o Grupamento de Engenharia do Exército, mal cuidado e sem aquele brilho que tanto simbolizava aquela guarnição. Próximo, onde era uma das mais belas mansões, agora é um suntuoso templo da igreja Universal do Reino de Deus.

Provavelmente esta é uma realidade nas demais cidades de um país que normalmente não valoriza a sua tradição, a sua história, sua memória, mesmo quando protegida pelos órgãos que, teoricamente, se propõem a cuidar do acervo patrimonial.

A repaginação é salutar, necessária e evolutiva mas deve obedecer padrões, regras, ordenamentos, para não descaracterizar a história, uma época. Temos que ter zelo com o nosso patrimônio cultural e arquitetônico e não dar espaço para os milhares de "Gedeus" que, em benefício próprio, desfiguram áreas e edificações que marcaram época.

25/11/16